Envolvendo milhares de soldados e centenas de tanques e caças-bombardeiros ante a “ameaça” de ataque vindo do Oriente, o exercício em larga escala da OTAN Defensor da Europa 2020 está no auge, perto da fronteira russa.
O principal objetivo das manobras pretende ser o de assegurar a prontidão das forças dos EUA para apoiar seus aliados na Europa. O exercício consiste fundamentalmente em testar a capacidade de transpor grandes obstáculos aquáticos, como rios.
O aliado mais dedicado
Segundo declarações oficiais, o objetivo estratégico do exercício seria o de demonstrar o compromisso dos EUA com a OTAN e sua “determinação inabalável em apoiar os aliados europeus”.
As maiores manobras da OTAN em 25 anos acabaram sendo adiadas para junho devido à pandemia do novo coronavírus.
Inicialmente, o Pentágono alocou cerca de 37 mil soldados e oficiais aos exercícios. Contudo, os planos seriam alterados, passando a ser a Polônia – uma das mais leais aliadas de Washington – a fornecer o grosso das tropas para a operação.
Foi precisamente na Polônia que há dias começaram a aterrissar aviões de transporte com soldados e equipamentos norte-americanos.
Com mais de dois mil equipamentos militares, que englobam 100 tanques, 200 veículos blindados, artilharia, equipamentos de defesa antiaérea, aviões e helicópteros, tropas polonesas e norte-americanas realizarão diversas operações de combate.
Apesar da pandemia, “o Exército polonês não perdeu por um momento sua prontidão de combate”, vangloriou-se o ministro da Defesa da Polônia, Mariusz Blaszczak.
O principal exercício tático consiste em ensaiar a transposição de obstáculos aquáticos por tropas em veículos blindados e aerotransportadas e a passagem para contra-ataque.
Artyom Kureev, especialista militar do clube de análise Valdai, vê neste exercício o principal objetivo do Defensor da Europa 2020 (Defender Europa 2020).
Além desse fato, permitirá igualmente aos militares tchecos, poloneses e lituanos uma vez mais exercitarem o uso de equipamentos bélicos dos EUA que terão de adquirir, ressalva o analista.
“Mas politicamente é uma demonstração da prontidão da OTAN em libertar o território da aliança em caso de invasão de tropas ‘inimigas’, e em transpor [os rios] Neman e Daugava.”
O perturbado Báltico
Quase simultaneamente, decorrem as manobras navais em grande escala Baltops 2020, no mar Báltico. Ao todo, 18 países, 30 navios de guerra e mais ou menos o mesmo número de aeronaves estão participando do exercício. Tais manobras acontecem há 49 anos.
Segundo Kureev, o objetivo principal do Baltops 2020 é o de mostrar aos eleitorados da Estônia, Letônia e Lituânia que a aliança não permitirá o desembarque de fuzileiros russos nas praias de Saaremaa, Jurmala e Palanga.
Ninguém discute o direito dos países fronteiriços de proceder a exercícios militares na região. Contudo, nos últimos anos, é notório que as manobras dos EUA e da OTAN têm se aproximado cada vez mais das fronteiras da Rússia.
“O eleitorado conservador e nacionalista dos Estados Bálticos, Polônia e República Tcheca deve ter a certeza de que os aliados os protegerão do ‘urso russo’ – um inimigo em potencial, o que é conveniente para eliminar muitos problemas políticos e econômicos internos”, referiu o especialista.
Oficialmente, os exercícios visam testar a capacidade de enfrentar um hipotético vizinho da Europa Oriental com um potencial militar comparável ao da Rússia, assinalou o especialista.
Tanto o Ministério das Relações Exteriores quanto o Ministério da Defesa russos reagiram aos exercícios, clamando para a necessidade de reduzir o grau de tensão latente e afastar as tropas da OTAN de suas fronteiras, pelo menos durante o período de comemoração do 75º aniversário da vitória sobre a Alemanha nazista.
Para o vice-ministro das Relações Exteriores da Rússia, Aleksandr Grushko, estes exercícios da OTAN foram decalcados dos da Guerra Fria e planejados de tal forma para que o pico de atividade coincida sempre com as comemorações da vitória sobre a Alemanha nazista.
“Isto é um fato”, afirmou Aleksandr Grushko, relembrando que os exercícios da OTAN estão sendo realizados um após o outro.
Grushko assinalou que cada vez mais aviões de reconhecimento voam nas imediações das fronteiras da Rússia, especialmente nos mares Báltico e Negro, relembrando igualmente a recente incursão da frota norte-americana no mar de Barents, algo que não acontecia desde meados dos anos 80.
EUA recorrem a expedientes para contornar acordos
Diplomatas e militares russos propõem sistematicamente que as partes envolvidas nos exercícios renunciem a grandes exercícios fronteiriços, cheguem a um acordo sobre uma distância mínima entre aviões e navios e utilizem transponders ligados em voos da aviação militar no Báltico. No entanto, não tem havido retorno a estas propostas.
O Ministério das Relações Exteriores da Rússia prevê que a atividade militar da OTAN aumente com a amenização da pandemia. Segundo Kureev, a Marinha também desempenhará um papel importante no apoio às forças terrestres da aliança.
No entanto, Baltops 2020 e Defensor da Europa 2020 não são comparáveis em amplitude com os exercícios da Guerra Fria, quando a organização do Pacto de Varsóvia e a OTAN mobilizavam para manobras dezenas e dezenas de milhares de tropas, chegando mesmo os exercícios soviéticos Dniepr de 1967 a movimentar mais de um milhão e meio de soldados.
Ao planejar exercícios, a OTAN viola frequentemente acordos internacionais subscritos, sobretudo o plasmado no artigo 8º do Documento de Viena sobre Medidas de Confiança e Segurança, assinado em 2011, que impõe muitas limitações às manobras em larga escala, relacionadas à notificação prévia.
Para contornar o estabelecido, a OTAN apresenta seus exercícios como uma série de manobras diferenciadas em diferentes países, eximindo-se à sua qualificação como de “grande escala”.
Enquanto o Ocidente ignora os acordos internacionais, a Rússia notifica a realização de exercícios ou os conduz longe de fronteiras alheias. A título de exemplo, as manobras Cáucaso 2020, previstas para este ano, terão lugar na região do Volga e do Cáucaso Norte.