O ministro da Água da Etiópia, Seleshi Bekele, anunciou quarta-feira que o enchimento do reservatório do controverso projeto da Grande Represa Etíope da Renascença já está em andamento, informou a Reuters. A declaração ocorre em meio a uma situação tensa com os países vizinhos, exacerbada um dia antes pelo fracasso de uma nova tentativa de negociações com o Sudão e o Egito.
“A construção da barragem e o enchimento de água andam de mãos dadas”, disse o ministro da Etiópia na quarta-feira, durante uma aparição na televisão. “O enchimento da barragem não precisa esperar a conclusão de sua construção.” O chefe de Água, Irrigação e Energia informou que o nível da água no reservatório subiu de 525 para 560 metros.
Localizados a jusante, o Sudão e o Egito temem que a nova barragem de seu vizinho cause escassez de água em seus próprios territórios, de modo que eles reagiram rapidamente.
O Ministério da Irrigação do Sudão rejeitou “qualquer ação unilateral adotada por qualquer das partes”, enquanto o governo alertou na quarta-feira que o nível da água no Nilo Azul caiu cerca de 90 milhões de metros cúbicos por dia depois de Addis Abeba começará a encher o gigantesco reservatório, localizado perto da fronteira com o Sudão.
Ao mesmo tempo, o governo egípcio pediu um “esclarecimento urgente” sobre o assunto, uma vez que as palavras do Ministro Etíope de Água, Irrigação e Energia na televisão nacional não especificaram se Adis Abeba fechou os portões da barragem ou se o reservatório começou a encher-se de água das recentes chuvas fortes.
No mesmo dia da tarde, Seleshi Bekele escreveu em sua conta no Twitter: “A entrada no reservatório devido a fortes chuvas e escoamento excedeu a vazão e criou um acúmulo natural. [O enchimento] continuará até ser acionado logo o estouro”.
Negociações fracassadas
Etiópia, Sudão e Egito passaram anos tentando, sem sucesso, chegar a um acordo sobre o projeto de uma enorme usina hidrelétrica que Adis Abeba começou a construir em 2011 em seu território. A mega-barragem, que tem um orçamento de quase 5 bilhões de dólares, é construída no curso do Nilo Azul, a principal fonte de fluxo do Grande Nilo, de cujas águas o Sudão e o Egito dependem.
A recente rodada de negociações patrocinadas pela União Africana, que há duas semanas iniciou uma série de reuniões virtuais com a participação dos três países ribeirinhos, terminou na terça-feira sem sucesso.
“As posições inalteradas e as demandas adicionais e excessivas do Egito e do Sudão impediram que essa rodada de negociações fosse concluída com um acordo”, declarou terça-feira o Ministério Etíope de Água, Irrigação e Energia. Ao mesmo tempo, Addis Abeba indicou que continua a considerar o diálogo e o compromisso como a única maneira de alcançar um resultado.
Por sua vez, o ministro das Relações Exteriores do Egito, Sameh Shoukry, disse na segunda-feira que “o Cairo mostrou muita flexibilidade e entendimento sobre os problemas da Grande Represa e as necessidades da Etiópia”, embora lamente que a rigidez da posição etíope causou “mais uma vez a rodada terminar sem um acordo”.
Segundo o governo do Sudão, existem “quatro ou cinco pontos problemáticos” entre as três partes, relacionados a questões técnicas, como o volume diário de água que deve passar pela barragem. Nesse sentido, o Sudão e o Egito consideram que esse volume deve ser maior do que o proposto pela Etiópia.