Com um pequeno tweet na quinta-feira, o secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, derrubou um dos últimos vestígios da recusa americana em reconhecer não apenas que Jerusalém era a capital de Israel, mas que fazia parte do estado judeu.
É verdade que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, já declarou que Jerusalém era a capital de Israel e ressaltou o ponto ao realocar fisicamente a embaixada dos Estados Unidos para lá. Mas quando cidadãos americanos com filhos nascidos em Jerusalém procuraram registrar o país de nascimento como Israel, os Estados Unidos recusaram.
Não era apenas que a opção de fazer isso estivesse ausente: havia uma diretriz explícita do Departamento de Estado que proibia isso. “Não liste Israel, Jordânia ou Cisjordânia para pessoas nascidas dentro das atuais fronteiras municipais de Jerusalém”, ordenou a diretiva.
Foi um lembrete gritante de que a política sob a qual um presidente ou embaixador poderia operar ainda não havia se infiltrado na política americana. Quando se trata de Jerusalém, a cidade ainda estava divorciada do país. Cidadãos americanos nascidos em Taiwan poderiam listar Taiwan ou China, mas os nascidos em Jerusalém não tiveram opção semelhante.
Para entender o quão longe os EUA avançaram em apenas alguns anos do mandato do governo Trump, não é preciso olhar para trás, não mais do que a viagem de relâmpago do ex-presidente dos EUA, Barack Obama, a Israel para elogiar o ex-presidente do país e primeiro-ministro Shimon Peres em setembro 2016, poucos meses antes de deixar o cargo.
Obama fez seu elogio em Jerusalém Ocidental, no cemitério nacional do país no Monte. Herzl, onde a maioria dos líderes do país e heróis militares estão enterrados. Mas a Casa Branca ainda se recusou a reconhecer que Obama estava realmente de pé em Israel.
Sua postura era tão evidente porque a Casa Branca retirou uma cópia inicial do discurso de Obama que o colocava em “Jerusalém, Israel” e a reeditou, tendo apagado a palavra Israel e deixando apenas a designação de Jerusalém.
Era como se a cidade antiga, lar das três principais religiões monoteístas do mundo – Judaísmo, Israel e Cristianismo – fosse um país em si, ao invés da capital do moderno Estado Judeu de Israel.
Em questão não estava o conflito israelense-palestino, mas sim a recusa dos Estados Unidos na época – e de fato na maior parte do mundo – em reconhecer os direitos e soberania israelenses sobre qualquer parte de Jerusalém.
A Bíblia, o livro mais lido do mundo, pode falar de Jerusalém, de onde o rei Davi governava, como a capital do antigo estado judeu. E o Templo Judeu pode ter estado em sua altura montanhosa.
Mas por mais de um século, a comunidade internacional não conseguiu reconhecer os judeus os direitos nacionais à sua capital bíblica – mesmo aquelas partes, como o Monte. Herzl, que está na parte oeste de Jerusalém e não tem relação com o conflito israelense-palestino.
Parte do problema remonta ao conceito, expresso em latim, de corpus separatum, em que a comunidade internacional inicialmente imaginou Jerusalém como uma cidade internacional. Foi um conceito que foi codificado no plano de partição das Nações Unidas de 1947, conhecido como Resolução 181, e novamente na Resolução 194 de 1948. As resoluções ainda não foram revogadas e o texto posterior ainda é referenciado em documentos.
Há algo de especial no argumento do corpus separatum, no qual uma cidade sagrada para as três religiões deveria ser internacionalizada em vez de nacionalizada por uma única nação soberana.
O argumento, no entanto, teria que ser usado contra todos os requerentes da cidade – israelenses, palestinos e jordanianos, estes últimos que mantêm uma relação especial de custódia no Monte do Templo, conhecido como islamismo como al-Haram al-Sharif.
A comunidade internacional se apegou à ideia de corpus separatum quando se trata de judeus, cuja conexão com a cidade está historicamente documentada e antecede as do islamismo e do cristianismo.
Mas abandonou o conceito de corpus separatum quando se trata de palestinos, reconhecendo que Jerusalém oriental deveria ser a capital de um estado palestino, mas em muitos casos não reconhecendo que Jerusalém ocidental é a capital de Israel. Esse é o caso, embora a Cidade Velha, o coração histórico das três religiões monoteístas, esteja tecnicamente localizada em Jerusalém Oriental.
A negação dos direitos israelenses a Jerusalém tornou-se um rito anual, principalmente nas Nações Unidas, que aprovam várias resoluções sobre o assunto. Embora muitas de suas condenações sejam específicas à presença de Israel em Jerusalém oriental, elas também contêm uma linha mais global que pode ser vista como um reflexo de toda Jerusalém.
Eles freqüentemente observam que as ações israelenses para “alterar o caráter e o status da Cidade Santa de Jerusalém” e devem ser rescindidas imediatamente.
Após a criação do Estado de Israel, os Estados Unidos apoiaram a posição da ONU sobre Jerusalém. Rejeitou em particular a decisão israelense de anexar Jerusalém Oriental após a Guerra dos Seis Dias de junho de 1967 e a decisão subsequente de Israel de cimentar essa anexação com uma votação do Knesset em 1980.
As opiniões do Congresso e da Casa Branca começaram a se dividir sobre o assunto. Já em 1990, a Câmara dos Representantes dos Estados Unidos reconheceu não apenas que Jerusalém era a capital de Israel, mas que essa designação incluía uma Jerusalém unida, leste e oeste. O mais famoso dos textos do Congresso foi o Ato da Embaixada dos Estados Unidos de 1995, que exigia a transferência da embaixada dos Estados Unidos de Tel Aviv para Jerusalém.
Foi um mandato que cada presidente dos EUA adiou – até Trump. O atual presidente não apenas transferiu a embaixada para Jerusalém, mas também publicou um plano de paz que permitiria a Israel manter a maior parte dela.
Nesse ínterim, a administração dos Estados Unidos não reconheceu formalmente a soberania israelense sobre as seções da cidade localizadas além das linhas pré-1967. Mas o fez de maneira de facto – e com isso, apagou os últimos vestígios do corpus separatum.
O tweet de Pompeo na quinta-feira foi sobre passaportes e continha apenas algumas linhas curtas que pareciam ser sobre uma designação técnica para passaportes. Na verdade, foi uma mensagem para o mundo: que Jerusalém é parte integrante do Israel moderno.