Desde o golpe de Estado de fevereiro passado em Mianmar, centenas de milhares de pessoas pobres perderam o emprego e enfrentam graves problemas para conseguir alimentação.
Comer apenas uma vez por dia, muitas vezes apenas arroz acompanhado de poucas verduras, e ter de fazer dívidas para sobreviver é a triste realidade de muitos em Mianmar hoje.
“Comemos uma vez por dia. Não quero que minha família passe fome”, disse Win Naing Tun, de 26 anos.
Antes do golpe de Estado militar contra o governo civil de Aung San Suu Kyi, este pai de família, com três filhos, trabalhava às noites em uma fábrica de pescado.
O toque de recolher imposto pela junta militar impede que siga para o trabalho. Ele passa os dias em seu barraco em Hlaing Thar Yar, uma favela em Yangon.
A família não consegue mais comprar carne de porco e consegue apenas “algumas verduras e um pouco de pasta de pescado”, relata.
Na mesma área, Aye Mar também precisa se contentar em cozinhar arroz e algumas verduras. Ela teme que os sete filhos estejam desnutridos.
“Meu marido está desempregado. Aceita qualquer trabalho que aparecer, inclusive cavar fossas sépticas”, afirma.
Além disso, sair para procurar trabalho durante o dia é arriscado. Em março, o local foi cenário de confrontos violentos entre moradores e forças de segurança, que não hesitaram em atirar contra os civis.
Antes do golpe de Estado, muitos moradores de Hlaing Thar Yar trabalhavam no setor manufatureiro, sobretudo, nas fábricas têxteis que abastecem as marcas ocidentais.
As greves e a violência provocaram o fechamento da maioria das fábricas. Os habitantes da área não têm acesso aos auxílios trabalhistas, porque o sistema bancário está paralisado. Muitos estão endividados.
Este bairro não é um caso isolado. Os impactos e efeitos da pandemia da covid-19, assim como a crise deflagrada pelo golpe, podem dobrar a pobreza em Mianmar, que afetaria metade da população do país a partir de 2022. Isto significaria um retrocesso de 16 anos, adverte a ONU.
O Programa Mundial de Alimentos (PMA), das Nações Unidas, prevê que até 3,4 milhões de pessoas adicionais terão dificuldades para conseguir comida no próximo semestre.
Além da crise política, os preços dos alimentos básicos também registraram forte alta, assim como a gasolina, o que dificulta o transporte das mercadorias das zonas agrícolas para as cidades.
No fim de abril, o PMA anunciou uma ajuda alimentar para dois milhões de birmaneses. Outros organismos fazem um apelo aos moradores de Yangon com recursos suficientes que compartilhem comida com os mais pobres.
“Dependemos das doações. Se a situação continuar, vamos morrer de fome”, declarou Ni Aye, uma mãe de família de 51 anos.
Outras pessoas, como Aung Kyaw Moe, pretendem fugir da cidade, porque sentem que “está tudo fora de controle”.
Fonte: AFP.