O general russo Sergei Surovikin, vice-comandante das operações militares russas na Ucrânia, sabia dos planos de rebelião do líder do Grupo paramilitar Wagner, informou nesta quarta-feira (27/06) o jornal The New York Times, citando assessores do governo dos EUA que receberam informações dos serviços secretos.
Horas depois, o Kremlin chamou a notícia de especulação. “Em torno desses acontecimentos haverá muitas especulações e conjecturas. Creio que esse é um exemplo”, declarou o porta-voz do Kremlin.
Os assessores americanos acrescentaram que há sinais de que outros generais russos teriam apoiado a tentativa do líder mercenário Yevgueni Prigozhin de derrubar à força a liderança do Ministério da Defesa da Rússia.
Segundo essas mesmas fontes, ainda não está claro se Surovikin, o anterior comandante das tropas russas na Ucrânia, teria ajudado a planejar a revolta de Prigozhin, no fim da semana passada.
Líder respeitado
Analistas políticos veem Surovikin como um líder respeitado entre os militares russos e que ajudou a fortalecer as posições russas nas frentes de batalha após a contraofensiva ucraniana do ano passado, afirmou o New York Times.
Ele foi indicado para comandar as forças russas na Ucrânia em novembroe substituído já em janeiro, mas, segundo o jornal, manteve influência na execução de operações de guerra e é muito popular entre os soldados.
Prigozhin trabalhou com Surovikin durante a intervenção militar russa na Síria e já descreveu o general como o mais capaz das Forças Armadas da Rússia.
Os funcionários do governo americano avaliam que Prigozhin não teria iniciado sua rebelião se não esperasse contar com o apoio de outras pessoas em cargos de poder, escreveu o New York Times.
Os serviços secretos americanos ainda tentam determinar que grau de apoio Prigozhin tinha dentro da liderança militar russa. Analistas observam que o Grupo Wagner tomou facilmente o QG da campanha militar em Rostov.
Lutas internas
Se Surovikin esteve mesmo envolvido na rebelião, esse seria mais um sinal das lutas internas da cúpula militar russa desde o início da guerra na Ucrânia e poderia indicar uma divisão mais profunda entre os partidários de Prigozhin, de um lado, e os principais assessores militares do presidente Vladimir Putin, do outro: o ministro da Defesa, Sergei Shoigu, e o chefe do Estado-Maior, Valery Gerasimov, acrescentou o diário.
O jornal indica, contudo, que às autoridades americanas interessa difundir informação que abale o prestígio de Surovikin, que é considerado mais competente e impiedoso que os outros membros do comando, e cuja destituição beneficiaria a Ucrânia.
Na sexta-feira passada, pouco depois do início do levante, Surovikin havia apelado aos combatentes do grupo Wagner a pararem e regressarem às suas casernas antes que fosse tarde demais. “É necessário obedecer à vontade e às ordens do presidente eleito da Rússia”, afirmou num vídeo difundido no Telegram por um jornalista da televisão estatal russa.
Troca no comando da guerra
Em janeiro, Shoigu nomeou Gerasimov comandante das forças russas na Ucrânia, em substituição a Surovikin, que havia assumido o cargo há apenas três meses.
A condução da guerra por Surovikin foi seguidamente elogiada por Prigozhin, que já se referiu a Shoigu nos piores termos possíveis e inúmeras vezes criticou Gerasimov.
Em fevereiro, por exemplo, Prigozhin disse que, quando Surovikin comandava as forças russas na Ucrânia, o Grupo Wagner não tinha problemas de munição.
Ele sugeriu, então, que os problemas começaram quando a liderança da campanha foi assumida por Gerasimov. Ele falou que, enquanto alguns comem com “talheres de prata” e mandam suas filhas e netos de férias para Dubai, “soldados russos estão morrendo na linha de combate”.
Rivalidade com Shoigu e Gerasimov
A tensão entre Prigozhin, de um lado, e Shoigu e Gerasimov, do outro, atingiu um ponto alto em 10 de junho, quando Shoigu anunciou que os grupos mercenários, como o Wagner, teriam que assinar contratos com o Ministério da Defesa até 1o de julho.
Putin apoiou a decisão de Shoigu, mas Prigozhin reafirmou sua recusa em assinar qualquer contrato. Já naquele momento serviços secretos ocidentais detectaram que a tensão poderia resultar numa rebelião do chefe do Grupo Wagner.
Nesta segunda-feira, ao justificar o fim da sua rebelião, Prigozhin disse que precisava salvar a organização e rejeitou ter tentado um golpe de Estado. “O objetivo da marcha era evitar a destruição do grupo Wagner”, disse Prigozhin numa mensagem áudio de 11 minutos, em que quebrou o silêncio que mantinha desde sábado, quando recuou na “marcha sobre Moscovo”. Segundo ele, o grupo Wagner “estava ameaçado de desmantelamento pelas autoridades” russas.
O líder mercenário insistiu que o objetivo não era derrubar o poder no país.
Segundo o ditador de Belarus, Aleksandr Lukashenko, que mediou o acordo para pôr fim ao levante, o chefe do Grupo Wagner exigia de Putin a destituição de Shoigu e de Gerasimov.
Rebelião armada
Prigozhin, um aliado de longa data de Putin, lançou uma rebelião armada com seus mercenários na noite de 23 de junho, alegando que os militares russos mataram vários de seus combatentes num ataque aéreo, o que as autoridades russas negaram.
Um dia depois, quando a marcha comandada por ele chegou a cerca de 200 quilômetros de Moscou, Prigozhin anunciou que estava encerrando a rebelião. Pouco depois, o Kremlin anunciou que o líder mercenário iria para Belarus, com base num acordo mediado por Lukashenko, e que as acusações criminais contra os rebeldes seriam retiradas.
Prigozhin, que disse não ter intenção de derrubar Putin, chegou a Belarus na terça-feira (27), e as autoridades russas disseram ter encerrado uma investigação criminal sobre a rebelião armada.
Fonte: DW.