Ao menos 40 mortes vinculadas à cólera foram registradas em uma semana em Darfur, oeste do Sudão, que vive uma das piores crises humanitárias atualmente por conta de conflitos armados internos. Este é o surto mais grave da doença enfrentado pelo país africano, alertou nesta quinta-feira (14) a organização Médicos Sem Fronteiras (MSF).
Cenário da guerra entre o Exército sudanês e o grupo paramilitar conhecido como Forças de Apoio Rápido (FAR), a região de Darfur é a mais afetada pelo surto no último ano, segundo a organização.
“Além de uma guerra total, a população do Sudão está sofrendo agora o surto mais grave de cólera que o país registrou em anos. Somente na região de Darfur, as equipes do MSF atenderam mais de 2,3 mil pacientes e registraram 40 mortes na última semana”, afirmou a organização médica em um comunicado.
Desde julho de 2024, quase 100 mil casos de cólera foram registrados em todo o Sudão, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), que alertou que a doença está se propagando “por todos os estados sudaneses”.
O Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) informou que, desde agosto de 2024, foram registrados mais de 2.408 mortes em 17 dos 18 estados do Sudão.
A organização acrescentou que mais de 640 mil crianças com menos de cinco anos estão ameaçadas pela doença no estado de Darfur do Norte, cenário de intensos combates.
A temporada de chuvas, que se intensifica em agosto, pode agravar a crise de saúde, ao contaminar a água e danificar os sistemas de esgoto, enquanto o êxodo de civis em busca de refúgio espalha a doença.
Propagação da doença
A cólera é uma infecção intestinal aguda que se propaga através de água e alimentos contaminados com bactérias, frequentemente procedentes de matéria fecal. A doença provoca diarreia grave, vômitos e cãibras musculares.
Os sintomas podem evoluir para um quadro grave e fatal em poucas horas quando não são tratados, mas a cura pode ser por meio de uma simples reidratação oral e com o uso de antibióticos em casos mais graves.
Os casos de cólera registraram um aumento desde 2021, além de uma expansão geográfica. Segundo a MSF, no Sudão, o deslocamento em massa de civis, provocado pela guerra, agravou o surto ao deixar muitas pessoas sem acesso a água limpa para a higiene básica.
“A situação é mais extrema em Tawila, no estado de Darfur do Norte, onde 380 mil pessoas chegaram fugindo dos combates ao redor da cidade de El Fasher, segundo as Nações Unidas (…) Na cidade, a população sobrevive com uma média de três litros de água por dia, menos da metade do limite mínimo de emergência, de 7,5 litros por dia por pessoa para beber, cozinhar e higiene”, afirmou a ONG.
“Não temos banheiros, as crianças fazem suas necessidades ao ar livre”, contou à AFP Mona Ibrahim, uma mulher que chegou a Tawila há dois meses.
Segundo a ONU, desde abril quase 300 crianças foram afetadas pela cólera nesta cidade. “Nos campos de deslocados, as famílias muitas vezes não têm outra opção, apenas beber água contaminada”, declarou Sylvain Penicaud, coordenador da MSF em Tawila.
“Há duas semanas, um cadáver foi encontrado em um poço. Ele foi retirado, mas dois dias depois as pessoas foram obrigadas a beber dessa água novamente”, relatou.
Três anos de guerra, milhares de mortes
A guerra no Sudão, que completou três anos e provocou dezenas de milhares de mortes, além de ter forçado o deslocamento de milhões, resultou no que as Nações Unidas descrevem como “a pior crise humanitária do mundo”.
O conflito no país opõe as forças do chefe do exército, Abdel Fattah al-Burhan, às de seu ex-vice, Mohamed Hamdan Daglo, que lidera o grupo paramilitar Forças de Apoio Rápido (FAR).
Os combates dividiram o país em dois, com o Exército controlando o centro, o leste e o norte, e os paramilitares e seus aliados controlando quase toda Darfur e partes do sul.
Segundo a ACNUR, a agência da ONU para refugiados, se a guerra continuar, o fluxo de pessoas poderá ameaçar a “estabilidade global e regional”.
Fonte: AFP.