Líderes de todos os Estados do Golfo encontraram-se nesta terça-feira (5), na capital saudita Riad, pela primeira vez em quase quatro anos, terminando sua rivalidade com o Qatar e suspendendo o boicote da nação árabe.
Logo depois, surgiu a notícia que o Egito também assinou um acordo com Doha, pondo termo à crise entre os Estados.
A suspensão das sanções contra o Qatar, impostas desde meados de 2017, vai trazer estabilidade à região e ao mundo, considerou o assessor norte-americano da elite governante de vários Estados do Golfo em entrevista à Sputnik. Mas acordos adicionais com Israel só serão possíveis se a situação dos palestinos for resolvida.
Estados divididos
Em 2017, Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos (EAU) e Bahrein endureceram suas relações com Doha, cortando laços comerciais e empresariais e fechando as fronteiras, bem como suspendendo viagens aéreas entre os países.
Naquele período, o quarteto acusou o Qatar de prestar apoio demais ao Irã, o maior adversário dos Estados do Golfo na região, e patrocinar organizações como o movimento Irmandade Muçulmana e o Hamas. Doha, por sua parte, negou repetidamente todas as alegações.
Este boicote teve um impacto negativo no país rico em gás. Famílias inteiras foram separadas, a posição internacional do Qatar foi prejudicada e sua economia ficou em queda, com a agência de notação Standard and Poor dando-lhe uma perspectiva negativa em 2017.
Agora, no entanto, após os lados terem decidido pôr as diferenças de lado, as disputas do passado parecem ter acabado. Marc Schneier, um homem considerado um amigo próximo de vários monarcas do Golfo, diz que a decisão da Arábia Saudita foi uma “situação duplamente vantajosa para a região e para o mundo”.
Uma frente unida
O momento para esta reconciliação não é acidental. Isto acontece apenas semanas antes o presidente eleito Joe Biden tomar posse em 20 de janeiro, e Schneier tem certeza de que a decisão de resolver a disputa destina-se a agradar à nova administração em Washington.
“A Arábia Saudita gostaria de ter um bom começo com Biden e eles também desejam demonstrar que eles são líderes do Conselho de Cooperação do Golfo [CCG], e para fazer isso eles precisam deste tipo de iniciativas”, revelou o especialista.
No entanto, o estabelecimento de relações calorosas com o novo chefe em Washington não era a única preocupação de Riad e a reconciliação também teve como objetivo apresentar uma frente unida diante dos desafios na região, em particular diante do Irã.
Discursando durante a reunião do CCG nesta terça-feira (5), o príncipe herdeiro saudita Mohammed Bin Salman instou os Estados do Golfo a “unir seus esforços” para serem capazes de lidar com desafios tais como o programa nuclear iraniano e o projeto de mísseis balísticos da República Islâmica.
Embora Teerã tenha declarado várias vezes que seu programa nuclear tem exclusivamente fins pacíficos, Riad, bem como outros jogadores regionais incluindo Israel, insistiram que o Irã está desenvolvendo armas de destruição maciça que poderiam ser usadas contra eles.
Com o CCG agora formando um bloco unido, os sauditas esperam que esse eixo seja convertido em uma frente comum que também incluiria o Qatar, que tem mantido relações bastante amigáveis com a República Islâmica.
“É certo que cada Estado trará suas próprias relações com o Irã para a mesa, mas a mensagem geral é clara. O CCG é unido e vai agir como um todo”, disse Schneier.
Mais pactos com Israel?
Outra questão que exige resposta é se o CCG vai “agir como um todo” quando se tratar do caso palestino e do processo de normalização com Israel.
Em setembro passado, dois países membros do Conselho de Cooperação do Golfo – EAU e Bahrein – assinaram acordos de paz com Israel, e alguns sugerem que mais jogadores na região em breve seguirão seu exemplo.
Schneier acredita que a reconciliação entre antigos adversários foi um passo na direção de potenciais acordos entre Israel, os sauditas e até o Qatar.
Agora que o boicote terminou, isso pode liberar “um efeito dominó”, levando a uma série de acordos adicionais de normalização com Israel, mas Schneier está seguro de que, mesmo que tal reaproximação ocorra, não será às custas dos palestinos.
“Os sauditas e os qatarenses já disseram que a situação dos palestinos deve ser resolvida se Israel quiser avançar com acordos de normalização. O presidente eleito Biden suporta esta posição, porque sua administração está na mesma página com esses Estados do Golfo no que diz respeito à questão da Palestina”, concluiu.