Em maio de 2023, um conflito sangrento começou entre as etnias kuki e meitei em Manipur. Porém, mais do que uma questão étnica, a instabilidade permitiu o avanço da perseguição religiosa com violência extrema aos seguidores de Jesus, vistos como traidores das comunidades tradicionais na Índia. Veja o relato de Neinu (pseudônimo), uma jovem cristã deslocada que lembra com clareza sua jornada em busca de abrigo quando tudo que conhecia foi destruído, e o papel da fé nessa crise em Manipur.
Tento não pensar nisso. Mas, muitas vezes, me pego perdida em pensamentos sobre o que poderia ter sido. Enquanto minha família se escondia no quarto dos meus pais, enquanto uma multidão enfurecida causava caos do lado de fora do nosso portão pela segunda vez naquela noite, oramos de joelhos como uma família pedindo um fim menos doloroso se o pior cenário se concretizasse.
E se eles realmente conseguissem entrar? E se algo tivesse acontecido? Eu me pergunto quem estaria escrevendo este texto no meu lugar agora. Durante nossos momentos de oração familiar em nossa pequena sala de estar, meus pais enfatizavam a importância de interceder não apenas por nós mesmos, mas pela família e por aqueles que vivem perto de nós. Nosso portão, que não era nem o mais formidável nem o mais alto do bairro, surpreendentemente, não pôde ser escalado naquela noite. E esse é um dos muitos testemunhos das orações da minha família.
Já se passaram quase dois anos agora. Vinte e três meses desde a última vez que vi e ri no conforto da nossa casa. Meus últimos cinco dias em Manipur pareceram um pesadelo. Nunca imaginei que teria que correr pela minha vida de pessoas com quem eu costumava andar pelas mesmas ruas. Minha família e eu passamos esses dias escondidos, sem saber o que seria de nós. O campo comunitário, que antes sediava jogos, agora nos abrigava como cidadãos deslocados que foram expulsos de suas casas da noite para o dia.
Foi desanimador e irônico ao mesmo tempo. Notei meu sobrinho, que mal tinha completado um ano, com buracos nas meias porque sua mãe só conseguiu empacotar comida e remédios. A cena de bebês doentes chorando nos braços das mães desamparadas era realmente triste de se ver. E há inúmeras histórias como essas entre os deslocados.
Aquela noite também foi a primeira em que dormi em um espaço aberto com nada além de um tapete rasgado separando o chão irregular e minhas costas. Foi também quando percebi que os dias ensolarados de maio podem ser bastante frios ao anoitecer. Um dia depois, minha família se reuniu com nossos vizinhos no aeroporto, onde passamos mais três noites enfrentando o frio e os mosquitos indesejados. Entre alimentação irregular e uma longa caminhada escondidos, encontramos abrigo ao chegar a um estado vizinho.
Nosso intenso trauma e o clima sufocante não se misturavam bem. Quando me deitei no colchão quente e confortável em nossa hospedagem, percebi que era a primeira vez em quase uma semana que eu me deitava em uma superfície macia. Estava exausta, ainda mais depois de acessar a internet. Vi postagens em redes sociais de pessoas que eu considerava amigas e conhecidas e notícias falsas circulando.
Tudo isso afeta minha saúde mental, mas, lembro-me de como sou privilegiada por ter conseguido escapar ilesa e me estabelecer em uma nova cidade. E a culpa me domina, especialmente quando vejo outros cristãos deslocados, mal conseguindo sobreviver enquanto vivem em condições apertadas e longe de serem sanitárias.
Penso comigo mesma: “Isso é o melhor que você pode fazer por você e por nós agora”. Contar o que vivi. Talvez, um dia, eu possa dizer aos meus filhos que não fiquei em silêncio. Como diz a Bíblia, o choro pode durar uma noite, mas a alegria vem pela manhã.
Ajuda emergencial para cristãos deslocados
Há centenas de cristãos como o pastor Yang que precisam de apoio para sobreviver e se manter firmes em Jesus. Faça uma doação e garanta que cristãos deslocados recebam socorro emergencial, cuidados pós-trauma e apoio espiritual.