Oficialmente, o Reino Unido deixa a União Europeia às 23 horas (20 horas de Brasília) desta sexta-feira (31), mais de três anos e meio depois de ter decidido pelo Brexit em um referendo, em 23 de junho de 2016. Mas isso não significa que os britânicos não estarão mais conectados ao bloco de um dia para o outro.
Durante 11 meses, as duas partes ainda terão um período de transição, em que vários detalhes do relacionamento entre elas serão negociados. Entre os mais importantes estão:
- Circulação de cidadãos europeus e britânicos entre Reino Unido e União Europeia (incluindo regras de habilitação e passaportes de animais)
- Permissões de residência e trabalho para europeus no Reino Unido e britânicos na UE
- Comércio entre Reino Unido e União Europeia, tarifas de importação, livre circulação de mercadorias
- Questões de segurança, compartilhamento de dados e segurança
- Licenciamento e regulamentação de medicamentos
- Circulação de alimentos
Destas, a questão mais importante, sem dúvida, é a comercial, já que a UE respondeu por 49% das negociações do Reino Unido em 2019.
Se em 11 meses não for possível chegar a um acordo sobre livre comércio, a saída será sem acordo. O Reino Unido passa a seguir os termos da Organização Mundial de Comércio e produtores e importadores britânicos passam a pagar tarifas que hoje não existem para vender e comprar produtos europeus, além de serem sujeitos às mesmas regras que outros parceiros da OMC.
O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, confia na negociação de um acordo satisfatório para ambas as partes, mas já anunciou que não irá pedir nenhuma extensão no período de transição, e que este será encerrado dentro da data prevista – 31 de dezembro de 2020 – independente do resultado.
Mas, caso mude de ideia, as duas partes têm até 1º de julho para definirem uma extensão.
Sem direito a voto
Já nesta sexta-feira, o Reino Unido automaticamente deixa de fazer parte das instituições políticas europeias, como o Parlamento Europeu e a Comissão Europeia, não tendo mais direito a voto.
No entanto, durante o período de transição, continua contribuindo para o orçamento da União Europeia, precisa continuar seguindo suas regras e está sujeito às determinações da Corte Europeia de Justiça em caso de disputas legais.
Irlanda e Irlanda do Norte
Uma das questões mais delicadas do Brexit sempre foi a das Irlandas: enquanto a República da Irlanda – um país independente – permanece na União Europeia, a Irlanda do Norte, que faz parte do Reino Unido, deixa o bloco nesta sexta.
O acordo de paz de 1999, que pôs fim a três décadas de sangrentos conflitos entre os dois países, contempla a ausência de barreiras físicas entre os dois lados.
Desde aquele ano, pode-se cruzar a fronteira sem passar por nenhum controle físico. A venda de bens e serviços ocorre com poucas restrições, já que ambos os lados fazem parte do mercado comum europeu e da união aduaneira.
Mas, a partir desta sexta-feira, a fronteira entre as duas Irlandas passará a ser, na prática, a fronteira física entre a UE e o Reino Unido.
As negociações sobre como a questão irlandesa seria abordada no Brexit foram justamente o que emperrou os planos apresentados pela ex-premiê britânica Theresa May no Parlamento britânico, e o motivo pelo qual eles foram rejeitados.
O plano que Boris Johnson conseguiu acordar com a UE e aprovar no Parlamento prevê que não haverá novas checagens ou controles de mercadorias que cruzem a fronteira entre as duas Irlandas. Para isso, a Irlanda do Norte será uma exceção: continuará seguindo as regras da União Europeia em relação a produtos manufaturados e de agricultura, diferente do restante do Reino Unido.
Além disso, todo o restante do Reino Unido irá deixar a união aduaneira da UE, mas a Irlanda do Norte continuará aplicando o código alfandegário europeu em seus portos.
Com isso, produtos e processos terão novas checagens e processos não ao circular entre Irlanda do Norte e Irlanda, mas sim entre Irlanda do Norte e os outros países do Reino Unido: Inglaterra, País de Gales e Escócia.
O que o Reino Unido e a União Europeia ainda precisam discutir são a natureza e a extensão dessas checagens e processos, uma operação que será conduzida por um comitê conjunto, liderado por um membro da Comissão Europeia e um ministro britânico.
Durante o período de transição, até dezembro de 2020, haverá ainda um comitê exclusivo para discutir questões relativas à Irlanda do Norte.
E existe também um compromisso de que, caso não se chegue a um acordo ao final da transição, a Irlanda do Norte não será afetada pelas mesmas tarifas e barreiras comerciais que poderão ser impostas ao restante do Reino Unido pela União Europeia.
Adiamentos
Inicialmente, o Brexit deveria ter acontecido em 29 de março de 2019, mas foi adiado por três vezes, já que a ex-primeira-ministra Theresa May não conseguiu que o Parlamento britânico aprovasse o acordo de retirada que ela havia negociado com a União Europeia.
O desgaste causado pelas rejeições custou a ela o cargo, e May renunciou, sendo substituída por Johnson em junho do ano passado. Em sua primeira tentativa, o novo premiê também fracassou e não conseguiu aprovar um acordo.
Isso mudou, porém, depois que foi reconduzido ao cargo depois que seu partido, o Conservador, ganhou as eleições em dezembro. Já com a maioria parlamentar garantida, ele conseguiu aprovar com facilidade seu plano no início deste ano e dar prosseguimento ao Brexit, cumprindo a data de 31 de janeiro.
Fonte: G1.