“…e haverá fomes,” Mateus 24:7
16 de julho de 2019.
O relatório anual de várias organizações da ONU publicado nesta segunda-feira alerta que cerca de 821,6 milhões de pessoas passaram fome em 2018 em todo o mundo, um aumento de 10,6 milhões em relação ao registrado no ano anterior, o que representa o terceiro aumento consecutivo.
Depois de décadas de declínio, a desnutrição vem aumentando desde 2015. Contra um dos objetivos de desenvolvimento sustentável de 2030, a perspectiva de um mundo sem pessoas subnutridas neste período é um “imenso desafio”, diz o relatório.
Intitulado “O estado da segurança alimentar e nutricional no mundo”, o relatório pede ação: “Para garantir a segurança alimentar e nutricional, é fundamental ter políticas econômicas e sociais para neutralizar os efeitos de ciclos econômicos adversos quando eles chegam, evitando a redução de serviços essenciais como assistência médica, saúde e educação”, diz o texto.
Apelando para uma “transformação estrutural”, que inclua os mais pobres, o documento pede para “integrar a segurança alimentar e nutricional nos esforços de redução da pobreza”, ao mesmo tempo em que se combate as desigualdades de gênero e a exclusão de grupos sociais.
Aumento na América Latina
A desnutrição continua a prevalecer em continentes específicos: África (quase 20% da população afetada), América Latina e Caribe (menos de 7%) e Ásia (mais de 12%).
A deterioração da segurança alimentar na América Latina e no Caribe levou 42,5 milhões de pessoas a passarem fome no ano passado, um flagelo que atinge a Venezuela com força especial.
“Na América Latina e no Caribe, as taxas de subnutrição aumentaram nos últimos anos, em grande parte como resultado da situação na América do Sul, onde a porcentagem de pessoas com fome aumentou de 4,6% em 2013 para 5,5% em 2018”, informa a FAO, que tem sua sede regional no Chile.
A América do Sul é afetada pela extensa e profunda crise econômica pela qual a Venezuela está passando. Nos últimos anos, a prevalência de desnutrição no país caribenho multiplicou-se quase quatro vezes, de 6,4% em 2012-2014 para 21,2% em 2016-2018, aponta o documento.
“Durante os primeiros 15 anos deste século, a América Latina e o Caribe reduziram a desnutrição pela metade, mas desde 2014 a fome vem aumentando”, alertou Julio Berdegué, representante regional da FAO.
Na América Central e no Caribe, o percentual de pessoas afetadas pela fome continua a diminuir, com 6,1% e 18,4%, respectivamente, mas ainda acima da América do Sul, com 5,5%.
Com esses números, “temos que resgatar, em média, mais de 3,5 milhões de pessoas da fome todos os anos até 2030, se quisermos alcançar a meta de fome zero do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável”, disse Berdegué.
A ONU destaca que o aumento da fome reflete a desaceleração econômica na região, afetada nos últimos anos pela queda nos preços de commodities, que são motores do Produto Interno Bruto (PIB) da maioria dos países latino-americanos.
A queda do PIB e o aumento do desemprego em muitos países causaram um declínio na renda familiar, levando a uma recaída no combate à pobreza. Após vários anos de queda dos índices de pobreza, “o número de pobres aumentou de 166 milhões para 175 milhões entre 2013 e 2015, aumentando de 28,1% para 29,2% da população”, afirma a FAO.
Paradoxo da obesidade
Apesar dos dados alarmantes sobre o aumento da fome no mundo, paradoxalmente este relatório destaca que o sobrepeso e a obesidade continuam a aumentar em todas as regiões, especialmente entre crianças em idade escolar e adultos.
Em 2018, cerca de 40 milhões de crianças com menos de cinco anos no mundo tinham excesso de peso. Em 2016, os números chegavam a 131 milhões de crianças de cinco a nove anos, 207 milhões de adolescentes e 2 bilhões de adultos com sobrepeso, de acordo com o relatório.
O documento foi preparado pela Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), com a assistência do Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrícola (Fida), do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), do Programa Alimentar Mundial das Nações Unidas (PAM) e da Organização Mundial de Saúde (OMS).
Fonte: AFP