Apesar de os países-membros aderirem a uma estratégia conjunta de suporte à Ucrânia diante da operação da Rússia para a libertação de territórios dominados pelo regime de Vladimir Zelensky, a OTAN segue com divisões internas, explicitadas principalmente pelas tensões históricas entre Grécia e Turquia.
Diante do conflito ucraniano, os Estados Unidos aumentaram a presença militar na Grécia por meio de um fluxo intensificado no Porto de Alexandrópolis, localizado no nordeste do país. O porto estava desativado há mais de uma década e agora voltou ao funcionamento, diante da estratégia estadunidense de suporte ao regime ucraniano.
Essa mobilização estadunidense incomodou não só a Rússia, mas também a Turquia, diante de seus conflitos históricos com os gregos, marcados por reivindicações territoriais marítimas feitas pelos turcos.
Em uma entrevista concedida no início do mês, o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, reiterou declarações de autoridades turcas que disseram que “podemos [os turcos] chegar de repente uma noite” na Grécia. O mandatário enfatizou que os gregos devem levar a sério suas advertências sobre a resposta da Turquia a quaisquer ameaças.
O secretário-geral da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), Jens Stoltenberg, disse em setembro que teme uma guerra entre os dois países-membros.
O geógrafo Tito Lívio Pereira, mestre em estudos estratégicos da defesa e segurança pelo Instituto de Estudos Estratégicos (Inest) da Universidade Federal Fluminense (UFF), disse que os embates entre Turquia e Grécia se dão porque os países “nunca delimitaram sua fronteira marítima”. Em razão de sua posição estratégica geopolítica, os turcos conseguem fazer movimentações militares na região sem grande confrontação da OTAN, da União Europeia e de potências internacionais.
“Toda vez que o secretário-geral da OTAN, o Jens Stoltenberg, é confrontado com as ações marítimas turcas, ele acaba desconversando, dizendo que a Turquia é um parceiro importante do Ocidente na defesa da Europa.”
Segundo o analista, as potências ocidentais “acabam ficando constrangidas em fazer uma condenação muito dura às ações turcas”.
Diante disso, Grécia e França firmaram um pacto militar em 2021 que prevê que se uma nação — inclusive da OTAN — atacar um dos países, o outro poderia reagir em apoio.
“De um lado você tem a Turquia, que pega esse poder econômico e transforma em poder militar, capacidade industrial militar. Com isso, ela busca atingir objetivos expansionistas, ela tem um apetite territorial e imperial alicerçado no nacionalismo. Do outro lado, você tem uma Grécia que busca se fortalecer militarmente, mas também alianças regionais para conter esse avanço turco”, diz Pereira.
Para o historiador Victor Missiato, professor do Instituto Presbiteriano Mackenzie, o acordo entre França e Grécia foi um claro aviso para a Turquia e “abre prerrogativas para que um país da OTAN ataque outro país da OTAN e um terceiro ajude um dos dois”.
“Isso com certeza colapsaria a União Europeia. É algo muito improvável, mas com certeza colocaria a OTAN em xeque”, destacou o historiador.