Em entrevista conjunta com o primeiro-ministro israelense na Casa Branca nesta terça-feira (04/02), o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sugeriu que seu país poderia “assumir” a Faixa de Gaza e reerguer o território palestino até ele se tornar a “Riviera do Oriente Médio”.
O americano afirmou que vislumbra a suposta tomada do território pelos EUA como uma ocupação a “longo prazo”.
“Possuir aquele pedaço de terra, desenvolvê-lo, criar milhares de empregos. Vai ser realmente magnífico”, afirmou Trump.
Ele sugeriu também que os palestinos poderiam ser levados para fora de Gaza enquanto o território fosse restabelecido.
Gaza sofreu destruição em larga escala durante ofensiva israelense — que, por sua vez, foi uma resposta aos ataques do grupo palestino Hamas ao sul de Israel em 7 de outubro de 2023.
O americano indicou Egito e Jordânia como possíveis destinos para os palestinos de Gaza durante a suposta reconstrução pelos EUA, embora vários países no Oriente Médio já tenham rejeitado essa ideia antes.
“Acho que eles [palestinos de Gaza] deveriam receber um bom, fresco e bonito pedaço de terra, e nós conseguiríamos que algumas pessoas investissem dinheiro para construí-lo, torná-lo agradável”, declarou Trump, afirmando que “a coisa de Gaza não funcionou”.
O presidente americano rejeitou que seu plano tivesse qualquer relação com uma “solução de dois Estados” (caminho apoiado internacionalmente como solução para a paz entre Israel e os palestinos).
O líder isralense, Benjamin Netanyahu, afirmou que os planos de Trump são uma ideia “que vale a pena se prestar atenção”.
Para Netanyahu, o americano vê “um futuro diferente para Gaza”.
“Acho que é algo que poderia mudar a história”, afirmou o israelense.
O primeiro-ministro também disse que “Israel acabará com a guerra vencendo a guerra” — em meio a um cessar-fogo em Gaza que interrompeu, por enquanto, 15 meses de conflito entre Israel e o Hamas.
Reações
Pouco depois de Trump dar sua entrevista coletiva na Casa Branca, um representante do Hamas, Sami Abu Zuhri, chamou a proposta de “ridícula” e “absurda”.
“Qualquer ideia desse tipo é capaz de inflamar a região”, ele disse, de acordo com a agência de notícias Reuters.
Abu Zuhri também disse que a sugestão de Trump de que os moradores de Gaza sejam reassentados em países próximos é uma “receita para criar caos e tensão na região”.
“Nosso povo na Faixa de Gaza não permitirá que esses planos passem. O que é necessário é o fim da ocupação e agressão contra nosso povo, não sua expulsão de suas terras”, ele disse a vários meios de comunicação.
Riyad Mansour, o embaixador palestino nas Nações Unidas, disse: “Para aqueles que querem mandar [os palestinos] para um lugar feliz e agradável, deixe-os voltar para suas casas originais dentro de Israel”, respondeu Mansour, em um vídeo postado no X pela missão palestina na ONU.
“Nossa terra natal é nossa terra natal… eles querem reconstruir Gaza, as escolas, os hospitais, a infraestrutura porque é onde eles pertencem e eles amam viver lá. E eu acho que os líderes devem respeitar os desejos do povo palestino.”
Rashida Tlaib, a única palestino-americana do Congresso dos EUA, acusou Trump de “pedir abertamente por limpeza étnica”.
“Ele está perfeitamente confortável com cortar os americanos trabalhadores de fundos federais enquanto o financiamento para o governo israelense continua fluindo”, diz Tlaib, a representante democrata em Michigan em um post no X.
No passado, Tlaib criticou a forma como o ex-presidente dos EUA Joe Biden lidou com o conflito Israel-Hamas.
Em novembro de 2023, o Congresso votou para censurá-la — uma punição um passo antes da expulsão da Câmara — por seus comentários denunciando o governo israelense.
Poucos líderes mundiais se pronunciaram até o momento.
O primeiro-ministro da Austrália, Anthony Albanese, reiterou o apoio “de longa data” de seu país a uma solução de dois estados no Oriente Médio.
“Temos uma posição bipartidária de longa data para uma solução de dois estados”, disse ele a repórteres na quarta-feira, referindo-se à criação de um Estado palestino independente que existiria ao lado de Israel.
“A posição da Austrália é a mesma de hoje de manhã, do ano passado e de 10 anos atrás”, disse ele, acrescentando que essa posição recebeu apoio bipartidário.
Albanese acrescentou que não “faria um comentário diário sobre as declarações do presidente dos EUA”.
Após a coletiva de Trump e Netanyahu, a Arábia Saudita reafirmou sua posição de que não estabelecerá laços com Israel sem a criação de um estado palestino.
Esta posição é “firme e inabalável”, diz o Ministério das Relações Exteriores do país em uma declaração.
O ministério disse que esta “não é uma questão para negociação” e que não haverá “paz permanente” sem que os palestinos tenham seus “direitos legítimos” de estado garantidos.
Na coletiva na Casa Branca, Trump também disse que espera renovar o esforço para normalizar as relações entre Israel e a Arábia Saudita.
‘Surpresas’ e limitações do plano
Presente na entrevista na Casa Branca, o repórter da BBC Bernd Debusmann Jr. afirmou que, após o evento, o clima na sala era de “surpresa”.
“Enquanto a maior parte da imprensa aqui esperava muito pouca discordância pública entre Netanyahu e Trump, poucos esperavam que este pedisse abertamente uma ‘tomada de controle’ dos EUA” sobre Gaza, escreveu Debusmann Jr.
“Muitas perguntas certamente serão feitas sobre isso nos próximos dias — e resta saber como a Casa Branca esclarecerá esses pontos.”
Paul Adams, repórter de diplomacia da BBC, classificou os planos anunciados por Trump como “atordoantes”.
Para ele, Trump não deixou claro em que tipo de posição de autoridade internacional os EUA poderiam tomar Gaza.
“Trump diz que suas ideias têm amplo apoio, mas não há sinal disso no Oriente Médio. Egito, Jordânia e Arábia Saudita as condenaram”, escreveu o repórter da BBC em análise.
“Os palestinos na Cisjordânia ocupada por Israel também estarão se perguntando esta noite o que o presidente [Trump] tem reservado para eles”, afirmou.
O presidente americano afirmou que ainda não se decidiu sobre uma possível anexação israelense de partes da Cisjordânia, mas diz que fará um anúncio sobre isso “nas próximos quatro semanas”.
Adams indaga se “alguma coisa” dos planos anunciados nesta terça é “séria”.
“Com Trump, é difícil dizer”, ele mesmo rebate. “Mas ele derrubou décadas de política dos EUA para o Oriente Médio durante seu primeiro mandato — e parece pronto para fazer o mesmo agora.”
Fonte: BBC.